Confiança Criativa — resenha do livro dos irmãos Kelley

How Education
6 min readApr 22, 2019

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Nota do autor:
Em 2017, a ONU reconheceu o dia 21 de abril como dia para celebrar a criatividade. Esse ano, no Brasil, a mobilização para celebrar o dia mundial de criatividade acontece hoje (22 de abril), com o World Creativity Day Brazil, evento com atividades em 44 cidades do país.
Para celebrar a data, criamos uma resenha do livro Confiança Criativa para compartilhar com você.

A proposta de confiança criativa

Você se considera uma pessoa criativa? Se você estivesse em uma sala, com um grupo de pessoas que nunca viu antes, seria capaz de expor suas ideias sobre um novo produto, serviço ou modelo de negócios?

Grande parte de nós pode responder positivamente a primeira pergunta, mas, ao nos depararmos com a situação exposta na segunda pergunta, muitos de nós ficamos paralisados, sem qualquer tipo de reação e com aquela sensação inquietante de que seremos expostos a qualquer momento, certo?

Nós, das gerações que antecedem o desacortinamento proposto pela era digital, fomos programados para acreditar que não éramos criativos e que criatividade é uma espécie de dádiva restrita a artistas — de maneira geral (músicos, atores, autores, cineastas, escritores, pintores) — e algumas profissões consideradas “fora da caixa”, como por exemplo a publicidade, o design, a arquitetura.

Ei, espera um pouco: lembra de quando você era criança e você fazia, criava e pensava coisas que hoje seriam consideradas “coisa de louco”? Sim, aquele era o seu verdadeiro eu-criativo. Muito se discute em que momento deixamos de ser pessoas criativas. Sir Ken Robinson (leia o artigo “Sir Ken Robinson e os desafios da educação”), por exemplo, propõe uma discussão sobre o papel dos modelos tradicionais de ensino como inibidores da criatividade.

Mas, como resgatar e — melhor que isso — exercitar esse potencial criativo? Essa é a proposta do livro Confiança Criativa — libere sua criatividade e implemente suas ideias, publicado no ano de 2013 (no Brasil, 2014) pelos irmãos Kelley.

O conteúdo, as referências e os modelos propostos em confiança criativa

Um dos pré-requisitos para que se atinja a confiança criativa é acreditar que suas aptidões podem ser trabalhadas, portanto, se você é daquelas pessoas que pensam que esse tipo de coisa não é para você, a primeira coisa a fazer é se desapegar dessa crença.

Os autores se apoiam em uma metodologia desenvolvida pelo psicólogo Albert Bandura conhecida pelo desenvolvimento de um modelo de estudos com o nome de domínio guiado, que incorpora ferramentas de psicologia, como a aprendizagem por observação, persuasão e tarefas gradativas, levando pessoas a confrontarem suas fobias e refutá-las através de pequenos passos que podem ser executados de maneira programada. O processo está fundamentado no poder da experiência para derrubar crenças falsas (no caso do livro, que você não é uma pessoa criativa).

Logo na introdução do livro (o capítulo “a essência da inovação”), os autores propõem que todos nós temos um potencial criativo muito maior esperando para ser explorado. E falam com autoridade: são mais de trinta anos de trabalho em que inovação e criatividade são uma constante, incluindo, entre eles, o primeiro mouse da Apple. Segundo os Kelley, em todos os programas de inovação no qual estão envolvidos há sempre três fatores que devem ser equilibrados:

  1. Os fatores técnicos, ou praticabilidade — Novas tecnologias que podem proporcionar as bases para uma nova empresa ou um novo ramo de negócios.
  2. Viabilidade econômica, ou fatores de negócio — Não se trata apenas do desenvolvimento de uma nova tecnologia, mas, também de sua produção e distribuição de maneira economicamente viável.
  3. Fatores humanos — Ir além da observação do comportamento humano para conhecer as motivações e as crenças das pessoas. Esse fator não é considerado pelos autores como o mais importante entre os três, mas, segundo os mesmos, são os fatores humanos que podem proporcionar algumas das melhores oportunidades de inovação em um projeto.
    Segue um trecho do livro que traduz bem a importância dos fatores humanos: “A abordagem centrada no ser humano constitui a essência do nosso processo de inovação. A profunda empatia pelas pessoas faz das nossas observações fontes poderosas de inspiração. Nosso objetivo é saber por que as pessoas fazem o que fazem, tentando descobrir o que elas poderiam fazer no futuro. Nossas experiências em primeira mão nos ajudam a formar conexões pessoais com as pessoas para quem inovamos”.

Outro ponto do livro que merece atenção é o que eles denominam de “O paradoxo do fracasso”. Em miúdos, se você quer experimentar o sucesso, deve estar preparado para encarar o fracasso. E tem mais, quanto antes você fracassar durante um processo de inovação, maiores serão as suas chances de encontrar os pontos fracos do seu projeto e mais rapidamente poderá consertar os erros (é o velho método “tentativa e erro”).

A confiança criativa na prática

Na d.school, por exemplo, os alunos são incentivados a criarem uma série de projetos rápidos de design, em vez de um único e grande projeto, aumentando dessa forma, o número de ciclos de aprendizagem.

O capítulo 7 do livro traz uma série de desafios criativos, bem como de ferramentas que são utilizadas no processo de desenvolvimento de soluções, como os mapas mentais, 15 segundos de brilhantismo, exercício dos trinta círculos, mapas de empatia, foi bom que/seria bom se, speed dating, aquecimento dos apelidos, mapa da jornada do cliente, sessão de sonhos/reclamações e o exercício da carteira (posso jurar que esses nomes de ferramentas não foram criadas por mim — eles estão lá, no livro).

Um dos cases que chamam bastante atenção no livro nasceu em um curso oferecido pela d.school, o “Design for Extreme Affordability”.

Case — Embrace Infant Warmer

Projeto: pesquisar e criar o design para uma incubadora infantil de baixo custo para ser utilizada em países em desenvolvimento.

Problema*: Todos os anos, cerca de 15 milhões de crianças nascem prematuras ou abaixo do peso. Cerca de um milhão delas morre, muitas vezes em menos de 24 horas após o nascimento. As incubadoras tradicionais, que podem reduzir esses números, chegam a custar até 20 mil dólares, cada. (*dados retirados do livro Confiança Criativa)

Princípio da criação centrada no ser humano: desenvolver empatia pelo usuário final.

Um dos alunos da equipe responsável pelo desenvolvimento do projeto foi — em um primeiro momento — até o Nepal para uma pesquisa de campo. Chegando lá, notou que muitas das incubadoras instaladas nos hospitais estavam vazias. O aluno foi adiante em sua pesquisa de campo e um médico confidenciou que muitas das crianças que precisavam das incubadoras nasciam em vilarejos distantes e que as mães não deixariam seus filhos recém-nascidos nos hospitais, para que fossem tratados. Sendo assim, muitas delas voltavam para suas casas com seus filhos em condições de saúde desfavoráveis, mesmo sabendo que deveriam passar mais tempo nas incubadoras.

Novo foco para resolver o problema: como criar um dispositivo de aquecimento de bebês que ajude os pais em vilarejos distantes a dar aos bebês uma chance de sobrevivência?

Solução: Um saco de dormir com uma bolsa de parafina que, ao ser aquecida, mantém a temperatura estável por até 4 horas.

A importância da empatia e da pesquisa de campo

O protótipo foi testado em crianças residentes nas zonas rurais da Índia e foi ali, no contato direto com as mães indianas, que os desenvolvedores do projeto conheceram outra realidade que só seria possível através da observação e empatia: o termômetro ajustado no saco de dormir para ajudar a manter a temperatura do corpo da crianças em 37º não apresentava os retornos esperados, porque, segundo uma das mães pesquisadas, os remédios e soluções médicas vindas do ocidente eram muito potentes e fortes, portanto, se o médico prescrevesse uma colher de um determinado remédio, as moradoras daquela região dariam apenas metade da dose indicada e confessou que, como havia sido indicado que a temperatura ideal do saco de dormir era de 37º, elas esquentavam até que a bolsa atingisse a temperatura de 30º. Isso gerou uma última alteração no produto: no lugar de um termômetro indicando a temperatura da bolsa, apenas um botão indicando “ok” para quando a temperatura ideal fosse atingida.

Resultado: depois do lançamento do programa piloto na Índia, a equipe desenvolveu parcerias com ONGs em outros nove países e fecharam um acordo de distribuição global do produto — que pode, agora, ser aquecido com água quente — com a GE Healthcare.

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